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A Petrobras na contramão das estratégias globais do setor

Por Rodrigo Pimentel Ferreira Leão*

A estatal, sob Pedro Parente, e o governo Temer escolheram uma inserção internacional subalterna e que coloca em risco nossa soberania energética
Tânia Rego/Agência Brasil

Pedro Parente

Com Parente, a ordem é vender os ativos

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica aprovou a venda pela Petrobras de 22,5% do bloco BM-S-11 no campo de Iara para a empresa Total por um valor de 2,2 bilhões de dólares. Nesse campo, estima-se a existência de até 3 bilhões de barris recuperáveis de óleo, o que significa que a estatal brasileira vendeu para a companhia francesa cerca de 675 milhões de barris de suas reservas de óleo e gás.

Esse movimento é apenas mais um sinal de que a Petrobras e o governo brasileiro seguem na contramão do que fazem outras nações ao redor do mundo. Até 2014, o Brasil acompanhava os grandes players do setor e buscava ampliar sua atuação no setor de energia.

Ao se considerar a atual e futura demanda por petróleo e, ao mesmo tempo, a necessidade de transformação da matriz energética no mundo, o Brasil, principalmente por intermédio da Petrobras, definiu uma estratégia de diversificação das fontes energéticas, bem como de desenvolvimento tecnológico para exploração do petróleo. No Plano de Gestão e Negócios da petroleira entre 2007-2011, a estratégia era “liderar o mercado de petróleo, gás natural derivados e biocombustíveis na América Latina, atuando como empresa integrada de energia, com expansão seletiva da petroquímica, da energia renovável e da atividade internacional”.

A partir do governo Temer e a gestão de Pedro Parente, essa política foi, porém, esfacelada, dando lugar a uma visão curto prazista e subalterna na disputa geopolítica. O atual PNG da Petrobras (2017-2021) estabeleceu como principal objetivo a desalavancagem da estatal, reforçando que todas as ações para os próximos cinco devem ser orientadas por essa métrica. O forte redirecionamento estratégico alterou a visão do papel da estatal tanto na economia brasileira quanto na sua inserção global no setor de petróleo.

Um indicador que materializa essa mudança de visão são os investimentos. Em 2016, totalizaram um volume similar (14,1 bilhões de dólares) àqueles realizados em 2005. Mais grave do que a redução dos investimentos foi a política de venda de ativos intensificada por Parente. Segundo informou a Petrobras no seu último PNG, a meta de desinvestimentos para o biênio 2017-2018 foi de 21 bilhões de dólares. Ou seja, a Petrobras adotou uma política clara de transferências de seus ativos para empresas concorrentes do setor.

Entre os países que tem demonstrado forte interesse em ingressar no mercado nacional de óleo e gás estão a França e os Estados Unidos. Não é coincidência que os dois países, mesmo com a recente redução do preço de petróleo, fortaleceram suas estratégias de longo prazo para o setor de óleo e gás. Os objetivos de expandir e diversificar suas capacidades de fornecimento de óleo e gás, bem como atrair de parceiros para o desenvolvimento das mais diversas fontes de energia estiveram papel central na construção de tais estratégias.

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O setor naval empaca (Foto: Divulgação)

A França tem adotado uma postura bastante agressiva no setor de energia do Brasil. Recentemente, a empresa Tereos adquiriu a participação da Petrobras na empresa de biocombustíveis Guarani (cerca de 46%). A petrolífera Total, por sua vez, comprou participações no pré-sal dos campos de Libra (20%) e, mais recentemente, de Iara (22,5%). Os esforços da Total e da Tereos seguiram uma estratégia mais ampla da França de reorganização e inserção global no segmento de energia.

Segundo uma matéria assinada por Diana Viola no Oil&Gas Financial Journal, a internacionalização de suas empresas se caracterizou como um eixo estratégico do desenvolvimento do setor energético francês por três razões: 1) garantir o suprimento de óleo e gás num país em que o volume de reservas é relativamente baixo para atender sua demanda; 2) aproveitar novas oportunidades no mundo no segmento de energia; 3) permitir a expansão da cadeia de fornecedores, inclusive de menor porte, em termos globais.

Os EUA também estabeleceram como prioridade o acesso ao mercado brasileiro de energia. Como tem se divulgado amplamente, as empresas americanas realizaram forte ofensiva para alteração da lei do pré-sal, que retirou a obrigatoriedade de participação da Petrobras na exploração das reservas de óleo e gás.

Após essa mudança, a Exxon Mobil, a Chevron e a ConocoPhillips procuraram o governo brasileiro para expor seu interesse em atuar no pré-sal. A postura dessas companhias coincidiu com um redirecionamento estratégico da política de energia americana, em 2011, detalhada em um documento do governo denominado Blue Print for a Secure Energy. Em três das sete diretrizes estratégicas descritas pelo documento, o Brasil surgiu como ator fundamental para o setor energético americano – pré-sal, biocombustíveis e hidrocarbonetos não convencionais (gás de xisto).

Ao lado de França e EUA, outros países como China e Noruega colocaram no centro da sua política de energia a entrada no segmento de óleo e gás do Brasil. As estatais de petróleo do país asiático ingressaram no consórcio do pré-sal de Libra e a China realizou acordos com o governo brasileiro para fornecer financiamento em troca da venda de óleo e tecnologia avançada do setor. No caso norueguês, a Statoil, no fim de 2016, comprou 66% do campo do pré-sal de Carcará.

Vários países têm estruturado estratégias bem definidas para o desenvolvimento do seu setor de energia, incluindo ações de fortalecimento da indústria local em âmbito internacional e o acesso a mercados relevantes globais. Tais estratégias tem combinado interesses de política externa e objetivos de desenvolvimento econômico.

A atuação das empresas de cada um desses países visam operacionalizar as diretrizes determinadas por seus respectivos Estados. Ao abandonar essa dinâmica, o Brasil vai na contramão do que tem sido feito no mundo. Com efeito, coloca a Petrobras como um ator subalterno na disputa geopolítica do petróleo e põe em xeque a capacidade de garantirmos a soberania energética no longo prazo.

* Economista e mestre em desenvolvimento econômico (IE/UNICAMP). Foi gerente executivo de planejamento da Fundação Petrobras de Seguridade Social (Petros). Atualmente, é um dos coordenadores do Grupo de Estudos Estratégicos e Propostas (GEEP) da FUP e pesquisador da Cátedra Celso Furtado/FESP-SP.

 

Os interesses internacionais contra o setor de petróleo no Brasil

Por Rodrigo Leão

A tese liberal de que há um suposto preconceito ou ranço ideológico entre todos os desenvolvimentistas contra a entrada do capital estrangeiro Brasil é uma falácia, o que ela esconde na verdade é a preocupação fundamental com a soberania nacional. Para além dos processos de privatização e abertura comercial, no caso do petróleo, a abertura do setor em 1997 permitiu que várias empresas globais pudessem explorar o mercado nacional, inclusive em setores mais dinâmicos como exploração e produção.

Na realidade, os gestores da Petrobras e os analistas alinhados ao pensamento de viés liberal utilizam essa tese do vício ideológico anti-capital internacional, justamente, para legitimar e apoiar a execução de um projeto articulado por certos atores estrangeiros do setor de petróleo.

No final de 2016, Ildo Sauer e Larissa Rodrigues chamaram a atenção para um documento do governo dos Estados Unidos de 2011, denominado Blue print for a secure energy future que escancarava a estratégia americana para o setor de petróleo para os próximos anos.

Esse documento  apontava sete iniciativas estratégicas de acordo com os EUA: “i) ampliar o desenvolvimento – que já está em curso há mais de 30 anos – do chamado “shale oil” e “shale gas” americano, que teve oportunidade de expansão, acompanhando a escalada dos preços do petróleo a partir de 2005; ii) exportar essa iniciativa para o mundo inteiro, especialmente para a China, que tem os maiores recursos, para a América Latina e Europa; iii) incentivar a produção de biocombustíveis no mundo inteiro, em parceria com o Brasil; iv) ampliar a produção de petróleo nos Estados Unidos por meio da plataforma continental americana; v) ampliar as negociações com o México para que a parte mexicana do Golfo do México seja aberta, pois na parte americana há muita produção; vi) cooperação dos Estados Unidos com o Brasil, negociada entre Obama e Rousseff, para promover o desenvolvimento e acelerar a produção dos recursos do pré-sal na plataforma continental brasileira como “interesse comum entre os dois países”; e, vii) trabalhar pela redução do consumo para o uso mais eficientes, como carros e equipamentos” (SAUER, RODRIGUES, 2011, p. 193-194).

Note-se que, neste documento, três iniciativas estratégicas se relacionam diretamente com o Brasil. O governo americano sinaliza que nas áreas de biocombustíveis, gás de xisto e pré-sal uma “cooperação” com o Brasil é fundamental e norteadora da política energética americana. A cooperação, aqui, pode ser entendida como possibilidade de acessar e explorar as fontes de energias do Brasil para atender aos interesses estratégicos do governo americano. Torna-se uma obviedade dizer que não é apenas o governo americano que enxerga o papel estratégico do Brasil no setor de energia para os próximos anos. A Europa e a China, por exemplo, são outras regiões que possuem grande interesse em fornecimento de petróleo e energia no longo prazo – para atender suas necessidades de demanda interna – e, por isso, estão em busca de acessar o mercado brasileiro.

O especialista Roberto Moraes adiciona um dado que reforça essa importância do Brasil no setor global de petróleo já no curto prazo: “O Brasil será o país – fora Opep – com o maior crescimento de produção de petróleo no mundo, com cerca de mais 250 mil barris por dia. Para a Opep, o Brasil poderá chegar à uma produção diária de 3,5 milhões de barris por dia. Isto se dá por um planejamento anterior que garantiu a entrada em funcionamento de três unidades de produção (plataformas) em 2016”.

É dentro dessa lógica que deve-se entender o interesse das empresas de petróleo globais sobre o mercado brasileiro. Eles são os intermediadores e executores das estratégias dos seus países de origem. Por isso, o profundo interesse em explorar o pré-sal brasileiro, o gás de xisto e atual no setor de biocombustível nacional. Além disso, a exploração dessas áreas abre espaço para a atuação de outros atores: os fornecedores globais dessas grandes empresas de petróleo. Isto é, o crescimento da atuação das transnacionais petroleiras, como Total, Shell e outras, no Brasil permite que as suas prestadoras de serviço possam atuar no país. Para isso, torna-se central a eliminação de políticas de conteúdo local, uma vez que limitam a atuação dessas fornecedoras no Brasil.

Não é por um acaso que, o atual governo, está colocando em discussão a alteração da política de conteúdo local que, no limite, pode eliminar a presença da indústria nacional no setor petróleo. Um estudo recente da Fiesp reforça essa constatação: “De acordo com o diretor titular do Decomtec [da Fiesp], José Ricardo Roriz Coelho, o impacto dos investimentos em exploração e produção de petróleo sem as regras atuais de conteúdo local será a redução brusca da atividade, e, com isso, o país terá adicionado centenas de milhares de novos desempregados aos mais de 12 milhões de pessoas desocupadas”.

Essas evidências sinalizam que as mudanças propostas pelo atual governo não dialogam com possíveis interesses em melhorar a competitividade e/ou alavancar os investimentos no Brasil. Tais mudanças, simplesmente, são a execução de um projeto energético articulado pelos grandes players globais. Ou seja, no grande teatro global do petróleo, o governo Temer optou por assumir o papel de marionete, repetindo como farsa a tragédia já conhecida do entreguismo no setor do petróleo.

Rodrigo Leão é economista

 

 

http://jornalggn.com.br/noticia/os-interesses-internacionais-contra-o-setor-de-petroleo-no-brasil-por-rodrigo-leao

Desmistificando a vida do petroleiro e petroleira

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Desde a sua criação a Petrobrás foi resultado de luta contra os norte-americanos e a demonstração de força dos brasileiros. Em 63 anos foram muitos desafios enfrentados e muitas vitórias alcançadas. Atualmente, estamos enfrentando uma “quebra-de-braço” e a tentativa de desmonte e privatização da estatal.

 

Uma empresa que em pouco mais de 60 anos criou outras marcas e/ou organizações, como por exemplo: BR Distribuidora, a Transpetro, Fafens, Biocombustíveis, Refinarias e Térmicas. Qual empresa que você conhece aqui no Brasil cresceu dessa forma?

 

Uma outra questão: Qual foi o estudante das décadas de 80 e 90 que não sonhou em trabalhar na Petrobrás?

 

E porque isso acontecia? Por ser uma empresa estabilizada, organizada e brasileira, representando a garra e alegria do povo brasileiro.

 

Precisamos estar atentos para entender a intenção do Governo Golpista em privatizar a nossa empresa. Destacamos alguns dados para comprovar a situação atual; a Petrobrás está avaliada em R$289,4 bilhões e registrou lucro de R$370 milhões no segundo trimestre de 2016.

 

Não é apenas vagas de emprego que estão em risco, mas sim a tentativa de minimizar e subjulgar o nosso país.

 

Temos que acompanhar de perto a situação da estatal, pois a grande mídia (Globo) faz questão de apresentar uma empresa falida, como se a única solução fosse a venda, todavia a Petrobrás está com o caixa positivo.

 

Outro ponto a ser discutido é a imagem que as pessoas tem dos funcionários da Petrobrás. Criou-se a ideia de que todos os petroleiros e petroleiras ganham muito dinheiro, só que na verdade o salario básico de um técnico que está hoje em uma Plataforma, Refinaria ou Terminal, gira em torno de R$3.500,00 a R$4.000,00, podendo chegar a R$6.000,00 caso seja um Pleno ou Sênior. O que eleva o salário de R$12.000,00 a R$18.000,00 é a condição de trabalho, é um ambiente periculoso, onde tem combustíveis, um confinamento numa plataforma, onde o trabalhador fica 14 dias em alto mar, a insalubridade em que ele está exposto a agentes químicos e físicos. Resumindo, é a venda da saúde e vida social, para poder ter um salário maior.

 

Um grande exemplo do que acontece dentro das plataformas está sendo veiculado nos cinemas, o filme “Horizonte Profundo” que retrata a trágica história da explosão da Plataforma de Perfuração Marítima Deepwater Horizon que matou 11 petroleiros, no Golfo do México em 20 de abril de 2010.

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Dentre tantas coisas, o filme aborda a sanha do Capital da indústria do petróleo e gás, representado pela petrolífera BP – British Petroleum, que sempre quer obter mais rendimentos e mais lucros custe o que custar, seja descumprindo leis e normas de segurança, seja explorando a força de trabalho das petroleiras e petroleiros, ou até mesmo ceifando vidas.

 

Fica a dica para toda classe petroleira e para aquele que quer saber como nós vendemos a nossa força de trabalho, a nossa vida social, familiar e nossa saúde e às vezes sangue para termos o nosso salário ao final do mês e ajudarmos no desenvolvimento do país.

 

É hora de juntarmos forças para mostrar que a Petrobrás e o petróleo são dos brasileiros e brasileiras e que não vamos abrir mão do que é nosso.

 

Vamos lutar contra o Desmonte e Privatização do Sistema Petrobrás.

 

Petroleiras e Petroleiros, Luta e Resistência!

 

Juntos somos mais fortes!

 

 

O que está acontecendo com a Petrobrás?

Hoje o meu convite é para reflexão do que vem sendo discutido e apresentado sobre a Petrobrás. Será que a saída é a privatização?

 

O novo plano de desinvestimento “voltou” a ser discutido com maior velocidade, após Pedro Parente assumir a presidência da Estatal. A redução de custos e aumento da receita são os principais focos desse planejamento, deixando claro a continuidade da pretensão em privatizar boa parte da Companhia. Mas, porque o “novo” plano está sendo projetado para 2017/2021, modificando o anterior que era 2016/2020? Aonde foi parar o ano de 2016?

 

Segundo a jornalista Claudia Siqueira, na sua matéria publicada no dia 27 de julho de 2016, “Em vez do esperado período 2016-2020, o novo plano está sendo revisto com projeção para o horizonte de 2017-2021, deixando de fora 2016, ano dado como perdido, já que a aprovação e a divulgação estão previstas para ocorrer entre o fim de setembro e o início de outubro.“

E a venda de ativos, como anda?

De acordo com Ramona Ordonez, em matéria veiculada no O Globo do dia 02 de fevereiro de 2016, “A Reduc e a Regap são da década de 1960, mas têm recebido investimentos para modernização nos últimos anos, para assegurar a qualidade dos combustíveis produzidos. A Regap tem capacidade de refinar 151 mil barris por dia, e a Reduc, outros 250 mil — é uma das maiores do país. De acordo com seu projeto original, o Comperj previa duas unidades de refino, com capacidade para processar 165 mil barris diários de petróleo, cada. Segundo uma fonte, o Comperj será apenas uma refinaria para produzir combustíveis, tendo sido totalmente abandonado o sonho de se construir um complexo petroquímico na região. Quando foi anunciado, em 2006, o Comperj seria um complexo para fornecer matérias-primas para a indústria petroquímica. As obras já consumiram cerca de US$ 15 bilhões, e nem a primeira unidade de refino foi terminada.”

Além disso, os patrimônios vendidos até agora, atingiram o valor de US$ 4,5 bilhões e inclui, a Carcará (US$ 2,5 bilhões), a Petrobrás Argentina (US$ 897 milhões), a Petrobrás Chile (US$ 464 milhões), os 49% da Gaspetro (US$ 540 milhões) e os ativos da Bacia Austral, na Argentina (US$ 101 milhões), segundo dados do site Brasil de Fato.

 

E o pior é que a privatização da Petrobrás continua em ritmo acelerado. A direção da empresa está negociando a venda de outros ativos importantes, como a BR Distribuidora, a Liquigás, a Nova Transportadora do Sudeste (NTS), terminais de GNL, Termelétricas, Campos Terrestres, Campos em Águas Rasas, Fafens, a Petroquímica Suape, a Companhia Integrada Têxtil de Pernambuco (Citepe) e parte do gigantesco Campo de Libra no Pré Sal.

 

Para completar no dia 29 de julho, o Conselho de Administração da Petrobrás aprovou a venda da participação no bloco exploratório BM-S-8  norueguesa Statoil Brasil Óleo e Gás por R$ 8,5 bilhões. Todavia, como justificar essa venda se o campo de petróleo renderia R$22 bilhões?

 

Companheiros e companheiras, já passou a hora de nos juntarmos e unirmos mais forças para combater o processo de sucateamento que está acontecendo com a nossa empresa. É necessário a participação dos petroleiros e petroleiras, além do povo brasileiro, pois a nova administração da Estatal está concentrada no plano de desinvestimentos, sem pensar nas consequências para a vida dos trabalhadores.

 

 

 

 

 

 

 

 

Pescadores de ilusões

Por Laura Carvalho

 

Na profusão de notícias atribuídas ao governo provisório, constam inúmeras medidas cuja radicalidade contrasta com a interinidade e a falta da legitimidade conferida pelo voto. Seria o caso de uma eventual privatização dos Correios e da Casa da Moeda.

Na taxonomia apresentada no “Staff Note” do FMI intitulado “Accounting devices and fiscal illusions”, cujo conteúdo resumi na coluna “Rigor Seletivo”, de 15/10/2015, uma das quatro formas de reduzir artificialmente o deficit público é a dos chamados desinvestimentos, que elevam receitas hoje em detrimento de receitas futuras.

Como aponta o autor, ainda que a arrecadação oriunda da venda de ativos públicos possa ser contabilizada como reduzindo o deficit imediato, o governo também perde os dividendos futuros das empresas privatizadas, o que pode tornar o benefício fiscal da operação muito menor ou até mesmo inexistente.

Os Correios, que não foram privatizados nem nos EUA por seu caráter estratégico e essencial, registraram em média R$ 800 milhões de lucro líquido por ano desde 2001 (aos preços atuais), dos quais ao menos 25% voltaram para a União na forma de dividendos. Antes do agravamento da crise, o lucro líquido dos Correios chegou a ultrapassar a faixa de R$ 1 bilhão, em 2012, e o da Casa da Moeda atingiu um recorde de R$ 783 milhões, em 2013.

Outros anúncios recentes reforçam a impressão de que a gestão das contas públicas pelo governo interino será menos transparente –além de mais regressiva e contraproducente– do que a posta em prática pelo governo eleito nos últimos anos.

O interventor destacado para o Ministério da Fazenda, o sr. Henrique Meirelles, anunciou, por exemplo, que buscará congelar as despesas públicas em termos nominais (sem o desconto da inflação). No entanto, conforme aponta o estudo do Ipea de Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair já divulgado pelo colunista Vinicius Torres Freire em 24/4/2016, quase 92% do aumento de gastos federais em 2015 deveu-se ao pagamento dos débitos com bancos públicos e FGTS –as tais “despedaladas fiscais”–, tendo o gasto real efetivo caído cerca de 4%.

Em mais um truque de ilusionismo fiscal, a equipe econômica provisória poderá aproveitar-se do aumento contábil de despesas em 2015 para vender o peixe da estabilidade no valor nominal dos gastos, sem ter de cortar despesas reais efetivas. Os cortes restringir-se-iam, portanto, aos itens que simplesmente não contam com a boa vontade dos apoiadores mais afoitos do golpe.

Uma das primeiras vítimas foi uma modalidade do programa Minha Casa, Minha Vida, cujo cancelamento anunciado pelo Ministério das Cidades na terça (17) implicará perdas não só de caráter social mas na geração de empregos do setor de construção. Só na cidade de São Paulo, 8.785 unidades habitacionais tiveram seu financiamento suspenso.

A julgar pelo perfil dos suspeitos, as próximas vítimas poderão ser o SUS, a universidade pública e o incentivo à pesquisa, o salário dos servidores menos influentes, ou os outros programas sociais. Os investimentos públicos em infraestrutura, que já vêm sendo atacados desde 2011, podem ser enterrados pela MP 727, de 12/5, que inaugura nova fase de concessões e privatizações.

Enquanto isso, o aumento de impostos progressivos continua fora da agenda, e a eliminação das desonerações fiscais, também. Já a volta da CPMF passou a ser recebida com tranquilidade. Tranquilidade perdida pelos que assistem mais uma vez à mudança das regras da aposentadoria, que, segundo Meirelles, terá de ser feita no meio do jogo.

Maquiavel teria aprovado: todo o mal, de uma vez, concentrado naqueles que sempre falaram menos e trabalharam mais.

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